Arquivo da categoria: drogas

Nascimento e morte de um drogado

O Novo México é um estado americano. É lindo. Tem várias áreas desérticas muito bonitas. Eu gostei muito de uma cidadezinha meio alternativa chamada Taos, com menos de seis mil habitantes. O Novo México faz fronteira com o México e tem forte influência mexicana, inclusive a comida, da qual sou fã incondicional. Há muitos anos, a Universidade do Novo México estava fortalecendo os Estudos Latino-Americanos. Estavam me sondando para sair da Universidade da Flórida e ir para lá. Porém, eu sofro com alergias, inclusive respiratórias, que podem provocar asma. Em algumas horas ficou claro que não dava. O pó e a poeira do deserto estavam em todos os lugares.
Porém, guardei uma imagem bonita, turística, daquele estado.
Hoje, me chegou uma notícia que mostra uma realidade que os cenários esplêndidos não mostravam.
Há quem não saiba que quando uma gestante se embriaga, o bebê dentro da barriga também toma um porre; quando a gestante adquire uma dependência de drogas, o bebê nasce dependente. Já nasce drogado. Triste, muito triste. Muitos morrem em pouco tempo. Quando nascem, o resultado tão pouco é bom. A dependência que acompanha o bebê desde o período intra-uterino faz com que ele tenha crise de abstinência.
Em Lamadera, um casario à margem da estrada estadual NM 111, uma mulher drogada não conseguia lidar com a crise de abstinência de seu bebê recém-nascido. Desesperada, injetou cocaína no bebê. O bebê, claro, morreu. A droga fez com que aquela mulher, longe de ter o seu papel na maternidade, condição exaltada por quase todos, se transformasse em assassina de seu próprio bebê. Pior: colocou-o dentro de um saco plástico de lixo e jogou o cadáver dentro da lixeira coletiva. Foi presa.
Não sei se esse horror ocorreu ontem ou hoje. Não descobri o sexo do bebê sem nome.
Fica a lição: qualquer alteração bioquímica da mãe provoca alteração no bebê antes mesmo de nascer.
Peço que orem pela alma desse bebê.
Peço que orem, também, por essa mãe. Sei que é difícil.

GLÁUCIO SOARES

Mulheres no tráfico de maconha

Recebi do Zeca Borges:

Enquanto você vibrava com as atuações de Marta, Cristiane e Formiga na estreia da seleção na Copa do Mundo…

Duas mulheres são presas com oito tabletes de maconha em Piraí, RJ
Flagrante aconteceu dentro de ônibus, próximo a rodoviária, no Centro. Conselho Tutelar foi acionado, pois uma delas estava com filho de dois anos.
G1.GLOBO.COM

Crescem os homicídios em Campina Grande

Silvana Torquato, publicado no Jornal da Paraíba, 27.03.11

A banalização da violência, sobretudo o dano à vida, tem sido um dos maiores problemas enfrentados pela sociedade brasileira. Em Campina Grande, cidade localizada no Agreste paraibano, a realidade não é diferente, pois a cada ano o número de homicídios vem crescendo e jovens em idade produtiva são as principais vítimas.

Nos últimos cinco anos, 690 pessoas foram assassinadas na cidade por inúmeros motivos, sem contabilizar os dados deste ano, que já somam 32 até a última quinta-feira, dia 24. Fazendo um balanço desse aumento, pode-se afirmar que houve um crescimento de 53% se comparado os dados de 2006 (123 homicídios) com os de 2010 (189). Nesse período de cinco anos (2006 a 2010), o ano mais violento foi o de 2010, com 189 assassinatos, ou seja, a cada dois dias uma pessoa morreu de forma violenta na cidade. “Isso se deve também por ter sido um ano eleitoral, onde as discussões entre as pessoas ficaram mais acirradas”, disse a delegada de Homicídios de Campina Grande, Cassandra Guimarães. E o meio mais empregado para tirar a vida de uma pessoa continua sendo a arma de fogo, com 426 registros, representando 61,7% do total de assassinatos nesse período. Outro ponto de destaque nessa violência urbana é que jovens entre 18 e 24 anos representam a maioria dos homicídios, 226, vindo em seguida pela faixa etária de 35 a 64 anos, que são 113.

Para a delegada de Homicídios de Campina Grande, Cassandra Guimarães, a maioria dos crimes que aconteceu no município foram motivados por relações interpessoais, quando há uma rixa, motivo de vingança e cobrança de dívida. “Mesmo tendo forte atuação na cidade, o tráfico de drogas aparece nessas estatísticas como pano de fundo na prática desses homicídios. O que leva uma pessoa a cometer um crime são mais as discussões, que em muitos casos, são por motivo fútil”, afirmou.

Outra preocupação dos órgãos de segurança e que também é um dos principais fatores para a prática de assassinatos na cidade é o alto índice de pessoas que andam armadas e encontram facilidade para comprar armas de fogo. “Precisaríamos um trabalho mais social para que esses jovens fossem desarmados, isso ajudaria em muito a diminuição nos casos de homicídio. Teríamos que combater o mal na fonte e coibir de vez a venda de armas”, enfatizou.

Cinco localidades também foram apontadas pela Polícia Civil como sendo as mais violentas da cidade onde aconteceram mais homicídios entre 2006 e 2010: José Pinheiro (50), Pedregal (48), Bodocongó (41), Centro (40) e o distrito de São José da Mata (31). Um destaque nesses números é o aumento de crimes cometidos no Centro da cidade. Considerado por muitos, como lugar de muita movimentação e merecimento de maior atenção por parte das forças policiais, já que se caracteriza como área comercial, onde inclui bancos e lojas, o Centro de Campina Grande se apresentou nesses últimos cinco anos com um elevado número de homicídios.

Na avaliação de Cassandra Guimarães, José Pinheiro e Pedregal já são, historicamente, considerados bairros violentos, com incidência maior de crimes. “Nesses casos, seria necessário uma atuação maior da força policial ostensiva e à medida que se faz um trabalho mais preventivo nessas áreas, o número de homicídios tende a diminuir”, afirmou. Já em relação ao Centro, a delegada disse que o índice de crimes aumentou por ser uma área de lazer, onde se concentra grande aglomeração de pessoas em bares e outros empreendimentos festivos.

O cientista político e professor da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), José Maria Nóbrega aponta vários fatores para esse aumento de homicídios na cidade, que é considerada de médio porte. Mesmo tendo uma melhoria no âmbito socioeconômico, reduzindo, assim, a pobreza e a desigualdade, o aumento da renda familiar e a fragilidade das instituições de coerção terminaram contribuindo para esse alto índice de assassinatos nos últimos anos. “Se não melhorar a qualidade da polícia e implantar mais políticas públicas, essa tendência só tende a crescer”, afirmou.

Hoje, a Delegacia de Homicídios trabalha com dois delegados, Cassandra Guimarães (titular) e Francisco Assis da Silva (adjunto), oito agentes e dois escrivães.


Drogas e violência na Paraíba

Violência, tráfico de drogas e homicídios na Paraíba

Escrito e enviado por
Por José Maria Nóbrega, professor e pesquisador da UFCG


Em matéria publicada em jornal de grande circulação no estado da Paraíba, foi divulgada a notícia na qual há oferta – com demanda também crescente – cada vez maior de drogas no sertão e na capital paraibanos. Estimulado por tal informação, fui analisar mais pormenorizadamente os dados de violência de alguns municípios os quais foram citados na matéria como sendo os mais críticos.

“No caso do Sertão, nas cidades de São Bento, Patos, Santa Luzia e Princesa Isabel existiria o maior fluxo de entorpecentes. Nos locais onde existirem consumidores os traficantes chegam. As drogas estão cada vez mais sendo transportadas para o interior, porque lá as pessoas também têm poder aquisitivo. Um exemplo é a cidade de São Bento, onde há uma forte movimentação de dinheiro do comércio de redes e por conseqüência tem crescido também o tráfico de cocaína”, afirmou um delegado do GOE paraibano.

As afirmações acima são muito importantes por dois motivos:

1. o crime migra, e isso vem ocorrendo no Nordeste inteiro como conseqüência da diminuição dos espaços no Sudeste (sobretudo no Rio de Janeiro e em São Paulo);

2. a relação com a pobreza é nula. Ao contrário do que se pensa, a diminuição dela também vem estimulando o consumo de drogas.

Claro que a pobreza é um mal que deve ser extirpado da sociedade brasileira, contudo, no que tange à violência, o simples fato de arrefecê-la não traz relação causal com a violência.

Utilizando o exemplo citado pelo delegado do GOE, analisarei brevemente os dados de homicídios de São Bento e Patos, cidades sertanejas que vêm tendo destaque também na violência homicida. As mortes resultadas de agressão, sobretudo de arma de fogo, nessas cidades cresceram significativamente.

São Bento tem uma taxa de 49,4 homicídios por cada grupo de cem mil habitantes (dados de 2009) – quase cinco vezes maior do que o tolerável, segundo as Nações Unidas e a Organização Mundial de Saúde. Foram 15 pessoas assassinadas em 2009, em 2008 foram quatro mortes desse tipo, ou seja, mais que triplicou os números absolutos de homicídios nessa cidade de um ano para o outro.

Outra cidade importante do sertão paraibano, Patos, aparece em situação semelhante à de São Bento. Entre 2005 e 2009 houve crescimento linear nos seus números de homicídios, saltando de 12 assassinatos, em 2005, para 58 em 2009. Situada em nono lugar no ranking das cidades mais violentas por taxas de homicídios na Paraíba, Patos tem uma taxa de 51,6 homicídios por cem mil habitantes. Ou seja, a violência é crescente e visível, mas pode ser controlada. Porém, tem de ter vontade política!

Dito isto, algumas hipóteses podem ser levantadas:

1ª. Há oportunidade potencial em cidades do sertão paraibano para a prática de tráfico de drogas, comércio ilegal de armas, roubos e assaltos;

2ª. Com espaços abertos ao tráfico de drogas e a facilidade de se levantar recursos advindos dos roubos e assaltos (devemos destacar as explosões contínuas dos caixas eletrônicos), crimes como os homicídios tendem a crescer;

3ª. A marginalidade com maior poder econômico, a formação de grupos organizados criminosos, fica mais fácil o recrutamento de agentes corruptos do estado para a facilitação de suas atividades criminosas.

As instituições responsáveis pela segurança pública devem criar estratégias que superem as políticas públicas concentradas na região metropolitana (grande João Pessoa) e foque, também, nas cidades do interior, sobretudo aquelas com histórico de tráfico e de violência homicida crescente. Como pude ver na matéria, a polícia tem informações importantes que serão valiosas para uma política de gestão pública democrática na área da segurança pública. A sociedade paraibana clama pela redução dos espaços para a criminalidade e isso é perfeitamente possível!


Narcotraficantes – sócios garantidores dos Bancos Internacionais

O tráfico no Rio e o crime organizado transnacional
Os verdadeiros chefes do narcotráfico no Rio de Janeiro são ligados à rede do crime organizado transnacional que movimenta no sistema bancário internacional cerca de 400 bilhões de dólares por ano. A situação que vemos no hoje no Rio, diz o jurista Wálter Maierovitch, reflete um quadro internacional, onde as polícias só conseguem apreender entre 3 e 5% das drogas ofertadas no mercado. “É preciso ter em mente essa dimensão global do crime organizado na hora de buscar soluções para enfrentar o problema em nossas cidades”, defende.
Marco Aurélio Weissheimer
Os verdadeiros chefes do narcotráfico no Rio de Janeiro são ligados à rede do crime organizado transnacional que movimenta no sistema bancário internacional cerca de 400 bilhões de dólares por ano. Esses são os grandes responsáveis pela violência e pelo tráfico de drogas e armas em todo o mundo. A situação que vemos no hoje no Rio reflete um quadro internacional, onde as polícias só conseguem apreender entre 3 e 5% das drogas ofertadas no mercado. É preciso ter em mente essa dimensão global do crime organizado na hora de buscar soluções para enfrentar o problema em nossas cidades. A avaliação é do jurista Wálter Maeirovitch, colunista da revista Carta Capital e ex-secretário nacional antidrogas da Presidência da República. 
Compreender essa dimensão global é condição necessária para evitar discursos e propostas de soluções simplistas para o problema. Maierovitch dá um exemplo: “Os produtos principais do tráfico de drogas são a maconha e a cocaína. Tomemos o caso da cocaína. Sua matéria prima, a filha de coca, é cultivada nos Andes, especialmente no Peru, Bolívia, Colômbia e Equador. No entanto, a produção da cocaína exige uma série de insumos químicos e nenhum destes países tem uma indústria química desenvolvida. O Brasil, por sua vez, possui a maior indústria química da América Latina”. Ou seja, nenhum dos países citados pode ser apontado, isoladamente, pela produção da cocaína. Essa “indústria” tem um caráter essencialmente transnacional.
Novas tendências das máfias transnacionais
Presidente do Instituto Brasileiro Giovanni Falcone de Ciências Criminais, Wálter Maierovitch é um estudioso do assunto há muito tempo. O livro “Novas Tendências da Criminalidade Transnacional Mafiosa” (Editora Unesp), organizado por ele e por Alessandra Dino, professora da Universidade Estadual de Palermo, trata dessas ramificações internacionais do crime organizado. A primeira Convenção Mundial sobre Crime Organizado Transnacional, organizada pela ONU, em 2000, em Palermo, destacou o alto preço pago ao crime organizado internacional em termos de vidas humanas e também seus efeitos sobre as economias nacionais e sobre o sistema financeiro mundial, onde US$ 400 bilhões são movimentados anualmente. 
Em 2009, diante da crise econômico-financeira mundial, o czar antidrogas da ONU, o italiano Antonio Costa, chamou a atenção para o fato de que foi o dinheiro sujo das drogas funcionou como uma salvaguarda do sistema interbancário internacional. “Os bancos não conseguem evitar que esse dinheiro circule, se é que querem isso”, observa Maierovitch. A questão da droga, acrescenta, é muito usada hoje para esconder interesses geopolíticos. Muitos países são fortemente dependentes da economia das drogas, como é o caso, por exemplo, de Myanmar (antiga Birmânia), apontado pela ONU como o segundo maior produtor de ópio do mundo (460 toneladas), e de Marrocos, maior produtor mundial de haxixe.
Tráfico de armas sem controle
Uma grave dificuldade adicional que os governos enfrentam para combater o narcotráfico é que ele anda de mãos dadas com o tráfico de armas. O Brasil é um dos maiores produtores de armas leves do mundo. Em 2009, a indústria bélica nacional atingiu o recorde do período, com a fabricação de 1,05 milhões de revólveres, pistolas e fuzis, segundo dados da Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados do Exército. A falta de controle sobre a circulação de armas, observa Maierovitch, é um problema grave. Quando um carregamento com armas sai de um porto brasileiro, explica, exige-se um certificado de destinação. Mas, depois que o navio sai do porto, perde-se o controle. O certificado diz, por exemplo, que as armas vão para Angola. Mas quem garante que, de fato, foram para lá? Esse certificado serve para que, então? – indaga o jurista.
O quadro que vemos hoje no Rio, insiste Maierovitch, precisa ser amplificado para que possamos ver todas essas conexões com o crime organizado transnacional, que atua em rede com nós funcionando como pontos de abastecimento e distribuição. Essas redes são flexíveis e estão espalhadas pelo mundo, acessíveis a quem assim o desejar. Há várias portas de entrada para ela e identificar suas ramificações não é tarefa simples. O jurista cita o caso da cocaína. Cerca de 90% da cocaína consumida hoje nos Estados Unidos vem da Colômbia e entra no país pelo México. E 90% das armas utilizadas pelos cartéis mexicanos vêm dos Estados Unidos. Ou seja, há duas vias de tráfico na fronteira entre EUA e México: por uma circulam drogas e pela outra, armas.
Pacificação x Militarização
Neste cenário global de expansão e ramificação do crime organizado, Maierovitch considerou surpreendente e muito importante a recente ação policial no Rio de Janeiro, na Vila Cruzeiro e no Complexo do Alemão. Essa ação, destaca, traz elementos importantes que devem marcar a ofensiva contra o crime: reconquista de território, retomada do controle social nas comunidades, garantir cidadania e liberdades públicas à população que vive nestas áreas. A política que vem sendo implementada pelo governo do Rio, acrescenta, está baseada num conceito de pacificação e não de militarização como ocorreu, por exemplo, no México, onde o governo de Felipe Calderón colocou o Exército na linha de frente da guerra contra o narcotráfico e está perdendo essa batalha, com um grande número de vítimas civis.
No Rio, prossegue, o que houve foi uma reação a ataques espetaculares cometidos pelo tráfico, mas a política é pacificadora. “No início do governo de Sérgio Cabral fui um crítico à política que ele estava implementada e que seguia essa linha adotada no México. Mas agora a política é outra e merece apoio. Maierovitch critica o que chama de “ataques diversionistas” contra o governo estadual, que o acusam de favorecer as milícias ao focar sua ofensiva no Comando Vermelho e no Amigos dos Amigos. “Esse diversionismo só favorece o crime organizado. Há territórios que estão sendo retomados e rotas de tráfico interrompidas. É possível e fundamental reestabelecer a cidadania no Rio de Janeiro”, defende. 
Trata-se, em resumo, de uma luta permanente, global e em várias frentes, onde cada metro de terreno conquistado deve ser valorizado e cada derrota imposta ao crime organizado servir como aprendizado para maiores vitórias no futuro. Maierovitch conclui: “A Itália é a terra da máfia, é verdade, mas também se tornou a terra da luta contra a máfia. Precisamos aprender com essas experiências.”
Fotos: Polícia mostra drogas, armas e munições apreendidas no Complexo do Alemão (Marcello Casal Jr./ABr)
Extraído do sítio Carta Maior
Força Internacional de Paz, intelectuais, interação entre pesquisadores e policiais, drogas, cocaína durante a gravidez, custos da legalização da maconha, as drogas financiam os bancos 

Narcotraficantes – sócios garantidores dos Bancos Internacionais

O tráfico no Rio e o crime organizado transnacional
Os verdadeiros chefes do narcotráfico no Rio de Janeiro são ligados à rede do crime organizado transnacional que movimenta no sistema bancário internacional cerca de 400 bilhões de dólares por ano. A situação que vemos no hoje no Rio, diz o jurista Wálter Maierovitch, reflete um quadro internacional, onde as polícias só conseguem apreender entre 3 e 5% das drogas ofertadas no mercado. “É preciso ter em mente essa dimensão global do crime organizado na hora de buscar soluções para enfrentar o problema em nossas cidades”, defende.
Marco Aurélio Weissheimer
Os verdadeiros chefes do narcotráfico no Rio de Janeiro são ligados à rede do crime organizado transnacional que movimenta no sistema bancário internacional cerca de 400 bilhões de dólares por ano. Esses são os grandes responsáveis pela violência e pelo tráfico de drogas e armas em todo o mundo. A situação que vemos no hoje no Rio reflete um quadro internacional, onde as polícias só conseguem apreender entre 3 e 5% das drogas ofertadas no mercado. É preciso ter em mente essa dimensão global do crime organizado na hora de buscar soluções para enfrentar o problema em nossas cidades. A avaliação é do jurista Wálter Maeirovitch, colunista da revista Carta Capital e ex-secretário nacional antidrogas da Presidência da República. 
Compreender essa dimensão global é condição necessária para evitar discursos e propostas de soluções simplistas para o problema. Maierovitch dá um exemplo: “Os produtos principais do tráfico de drogas são a maconha e a cocaína. Tomemos o caso da cocaína. Sua matéria prima, a filha de coca, é cultivada nos Andes, especialmente no Peru, Bolívia, Colômbia e Equador. No entanto, a produção da cocaína exige uma série de insumos químicos e nenhum destes países tem uma indústria química desenvolvida. O Brasil, por sua vez, possui a maior indústria química da América Latina”. Ou seja, nenhum dos países citados pode ser apontado, isoladamente, pela produção da cocaína. Essa “indústria” tem um caráter essencialmente transnacional.
Novas tendências das máfias transnacionais
Presidente do Instituto Brasileiro Giovanni Falcone de Ciências Criminais, Wálter Maierovitch é um estudioso do assunto há muito tempo. O livro “Novas Tendências da Criminalidade Transnacional Mafiosa” (Editora Unesp), organizado por ele e por Alessandra Dino, professora da Universidade Estadual de Palermo, trata dessas ramificações internacionais do crime organizado. A primeira Convenção Mundial sobre Crime Organizado Transnacional, organizada pela ONU, em 2000, em Palermo, destacou o alto preço pago ao crime organizado internacional em termos de vidas humanas e também seus efeitos sobre as economias nacionais e sobre o sistema financeiro mundial, onde US$ 400 bilhões são movimentados anualmente. 
Em 2009, diante da crise econômico-financeira mundial, o czar antidrogas da ONU, o italiano Antonio Costa, chamou a atenção para o fato de que foi o dinheiro sujo das drogas funcionou como uma salvaguarda do sistema interbancário internacional. “Os bancos não conseguem evitar que esse dinheiro circule, se é que querem isso”, observa Maierovitch. A questão da droga, acrescenta, é muito usada hoje para esconder interesses geopolíticos. Muitos países são fortemente dependentes da economia das drogas, como é o caso, por exemplo, de Myanmar (antiga Birmânia), apontado pela ONU como o segundo maior produtor de ópio do mundo (460 toneladas), e de Marrocos, maior produtor mundial de haxixe.
Tráfico de armas sem controle
Uma grave dificuldade adicional que os governos enfrentam para combater o narcotráfico é que ele anda de mãos dadas com o tráfico de armas. O Brasil é um dos maiores produtores de armas leves do mundo. Em 2009, a indústria bélica nacional atingiu o recorde do período, com a fabricação de 1,05 milhões de revólveres, pistolas e fuzis, segundo dados da Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados do Exército. A falta de controle sobre a circulação de armas, observa Maierovitch, é um problema grave. Quando um carregamento com armas sai de um porto brasileiro, explica, exige-se um certificado de destinação. Mas, depois que o navio sai do porto, perde-se o controle. O certificado diz, por exemplo, que as armas vão para Angola. Mas quem garante que, de fato, foram para lá? Esse certificado serve para que, então? – indaga o jurista.
O quadro que vemos hoje no Rio, insiste Maierovitch, precisa ser amplificado para que possamos ver todas essas conexões com o crime organizado transnacional, que atua em rede com nós funcionando como pontos de abastecimento e distribuição. Essas redes são flexíveis e estão espalhadas pelo mundo, acessíveis a quem assim o desejar. Há várias portas de entrada para ela e identificar suas ramificações não é tarefa simples. O jurista cita o caso da cocaína. Cerca de 90% da cocaína consumida hoje nos Estados Unidos vem da Colômbia e entra no país pelo México. E 90% das armas utilizadas pelos cartéis mexicanos vêm dos Estados Unidos. Ou seja, há duas vias de tráfico na fronteira entre EUA e México: por uma circulam drogas e pela outra, armas.
Pacificação x Militarização
Neste cenário global de expansão e ramificação do crime organizado, Maierovitch considerou surpreendente e muito importante a recente ação policial no Rio de Janeiro, na Vila Cruzeiro e no Complexo do Alemão. Essa ação, destaca, traz elementos importantes que devem marcar a ofensiva contra o crime: reconquista de território, retomada do controle social nas comunidades, garantir cidadania e liberdades públicas à população que vive nestas áreas. A política que vem sendo implementada pelo governo do Rio, acrescenta, está baseada num conceito de pacificação e não de militarização como ocorreu, por exemplo, no México, onde o governo de Felipe Calderón colocou o Exército na linha de frente da guerra contra o narcotráfico e está perdendo essa batalha, com um grande número de vítimas civis.
No Rio, prossegue, o que houve foi uma reação a ataques espetaculares cometidos pelo tráfico, mas a política é pacificadora. “No início do governo de Sérgio Cabral fui um crítico à política que ele estava implementada e que seguia essa linha adotada no México. Mas agora a política é outra e merece apoio. Maierovitch critica o que chama de “ataques diversionistas” contra o governo estadual, que o acusam de favorecer as milícias ao focar sua ofensiva no Comando Vermelho e no Amigos dos Amigos. “Esse diversionismo só favorece o crime organizado. Há territórios que estão sendo retomados e rotas de tráfico interrompidas. É possível e fundamental reestabelecer a cidadania no Rio de Janeiro”, defende. 
Trata-se, em resumo, de uma luta permanente, global e em várias frentes, onde cada metro de terreno conquistado deve ser valorizado e cada derrota imposta ao crime organizado servir como aprendizado para maiores vitórias no futuro. Maierovitch conclui: “A Itália é a terra da máfia, é verdade, mas também se tornou a terra da luta contra a máfia. Precisamos aprender com essas experiências.”
Fotos: Polícia mostra drogas, armas e munições apreendidas no Complexo do Alemão (Marcello Casal Jr./ABr)
Extraído do sítio Carta Maior

Crianças ou monstrinhos?

Uma revista cientifica, The Journal of Child Psychology and Psychiatry publicou um artigo que conclui que nada menos de 98% das crianças com menos de dez anos de idade são sociopatas por critérios adultos. Não sentem remorso e se dedicam aos seus interesses egocêntricos e ao seu prazer.

Quem afirma isso é  Leonard Mateo, da University of Minnesota da corrente chamada de Psicologia Evolutiva que propõe a existência de mudanças significativas no comportamento social durante as várias etapas da vida. O comportamento social e o altruísmo seriam desenvolvidos não nasceríamos com eles. Crianças usariam e explorariam os adultos sem qualquer remorso para obter uma gratificação, seja um brinquedo ou um sorvete. De acordo com Mateo, essa “desordem social” é marcada por uma total falta de empatia e que crianças e jovens adolescentes se dedicam a satisfazer suas necessidades e buscam apenas seu prazer sem preocupação com o mal que podem causar a outros.

Há um teste chamado de Hare Psychopathy Checklist que é usado clinicamente para diagnosticar a psicopatia que acessa quatro importantes dimensões dessa doença mental: procuram parecer agradáveis, simpáticos e preocupados com os demais; comportamentos manipuladores; um sentimento de que são importantes e grandiosos, sem qualquer relação com a realidade e mentir patologicamente, que é o comportamento que usualmente “entrega” os psicopatas adultos. As crianças e jovens adolescentes saem mal neles.

Os pesquisadores observaram 700 crianças no seu quotidiano, concluindo que 684 exibiam esses comportamentos num, nível considerado sério. Outros comportamentos, que caracterizam as desordens anti-sociais estavam presentes: violência, incapacidade de planejar, pouco controle de seus próprios impulsos e, quando seus desejos não eram satisfeitos, tantrums (como se jogar no chão e ficar dando murros ou batendo com a cabeça no assoalho).

É um vale-tudo. Cansam rapidamente de uma coisa e passam para outra, mas a única preocupação é consigo. Mateo também afirmou que as crianças tinham uma capacidade limitada de aceitar a culpa e expressá-la e que não iam mais alem de um pedido insincero de desculpas, que raramente era espontâneo e tinham que ser “extraídos”.

A preocupação de Mateo é com os danos que esses comportamentos causam a outras crianças e a adultos. As avós seriam especialmente suscetíveis aos comportamentos manipuladores de nossos pequenos sociopatas.

É possível ver que essa pesquisa causou celeuma. Se, por um lado, ninguém duvida de que as crianças sejam diferentes dos adultos, nosso amor pelas crianças da família, particularmente filhos e filhas e netos e netas nos impede de observar objetivamente seu comportamento. Numa creche ou num orfanato, esses comportamentos são observáveis e claros – a violência é comum. Impera a lei do mais forte.

As reações foram variadas, mas quase sempre negativas. Evidentemente, os que acreditam que as crianças nascem puras e se “prostituem” ou deterioram a partir da infância têm uma visão oposta: a socialização adulta corrompe a pureza infantil e transforma anjinhos, que são as crianças, em monstros, que são os adultos.

Para outros, usando também dados de pesquisas físicas sobre a maturação cerebral (não nascemos com o cérebro completo: ele vai se desenvolvendo), é um processo biológico com profundas implicações sociais e criminais. A interrupção da maturação do cérebro é que explicaria a proclividade de adolescentes e jovens adultos a comportamentos delinqüentes e criminais.

A psicologia social e a sociologia também vêem esses comportamentos, mas definem suas mudanças como aprendidas. Autocontrole (por exemplo: da violência) seria aprendido. O crime e a delinqüência resultariam dos fracassos na aprendizagem.

Admito que, quando temos filhos e netos, consideramos esses resultados difíceis de digerir e até de serem analisados imparcialmente.

É uma área explosiva do conhecimento. Afinal, redefinir nossos filhos e netinhos como sociopatas é, primeiro, ofensa e, depois, possível verdade científica.

Mais aresultados do Disque-Denúncia

Informação do Zéca Borges:

Policiais do 14º BPM (Bangu) apreenderam, há pouco, sete fuzis dentro de uma cisterna, na favela Vila Vintém, em Padre Miguel. Os policiais fizeram a incursão na comunidade para checar a informação do armazenamento das armas que foram recebidas pelo Disque-Denúncia (2253-1177). Além das armas foram apreendidos ainda grande quantidade de drogas, carregadores e munição. É a sociedade ajudando a polícia em benefício de ambos.

Fatores de risco na delinquência juvenil

Inúmeras pesquisas, em vários países, revelaram uma associação entre o consumo de drogas (incluindo as bebidas alcoólicas) , e delinqüência e criminalidade juvenis. Marvin Dawkins foi mais adiante, demonstrando que tanto “drogas” quanto “delinqüência e criminalidade juvenis” são categorias amplas, que incluem muitas coisas diferentes: drogas incluem álcool, drogas leves (como a maconha) e pesadas (como a heroína); delinqüência e criminalidade incluem desde pixação e distúrbio da paz e da ordem até o homicídio. O poder de explicação do consumo de drogas variava de pesquisa para pesquisa: muito, numas; pouco, noutras. Outros pesquisadores contribuíram para colocar a delinqüência e criminalidade num contexto mais complexo: Simonds e Kashani descobriram que o número de drogas diferentes consumidas explicava melhor os crimes contra a pessoa do que o tipo de droga. Yu e Williford elaboraram uma teoria de comportamentos em cadeia: quanto mais cedo o/a menor consome drogas socialmente mais aceitas – incluindo álcool e cigarros – tanto mais cedo consumirá drogas ilegais (maconha e cocaína) que, por sua vez, fazem com que um número maior deles cometa crimes. Esta cadeia pode ser interpretada, bioquimicamente, ou dentro de um quadro social, com ênfase na falta de controle familiar e institucional. Sem a pesquisa, a teoria dos comportamentos em cadeia seria uma entre muitas, sem validade empírica. Foi neste contexto teórico que Dawkins realizou a sua pesquisa crucial que, com apenas 312 jovens delinqüentes do sexo masculino em reformatórios, é hoje uma das mais importantes. O consumo de álcool está correlacionado com todos os comportamentos delinqüentes, mas os consumidores de maconha e de heroína estão concentrados em um número menor de ilícitos. A maconha, por exemplo, está associada ao comportamento delinqüente de gangues como a violência entre gangues, pequenos furtos de lojas, conflitos com a polícia etc. Já o consumo de heroína se relaciona com a violência e a falta de controle, expressos na seriedade da lesão provocada na vítima, na agressão a professores e supervisores, no tipo de arma usado nos crimes. Umas drogas se associam mais com alguns tipos de crime e violência do que outras. São respostas culturais. Dawkins também buscou saber qual o peso relativo das drogas em comparação com variáveis de importância demonstrada – no contexto americano – como ter sido preso e/ou condenado; ter cumprido pena e a raça do adolescente. A ficha policial e judicial do delinqüente pesa mais do que o consumo de drogas na explicação de doze comportamentos delinqüentes; o consumo de drogas pesava mais em seis comportamentos (entre os quais: conflito com a polícia; guerra de gangues; furto de partes de automóveis) e a raça em apenas dois: problemas com os pais e conflito físico com o pai, sublinhando a difícil relação entre filhos e o pai nas famílias negras americanas. O peso da “ficha” – ou história policial e judicial – passa por várias explicações. Uma hipotetiza a socialização negativa, que nos diz que as instituições de recuperação de juvenis seriam “escolas do crime”, argumento preferido pela esquerda, nos Estados Unidos como no Brasil. Supõe que as instituições ou não cumprem a sua missão de recuperação ou a cumprem mal. Se cumprissem, os que passassem por elas não voltariam a delinqüir ou, pelo menos, teriam taxas de novas delinqüências iguais à da população. A hipótese da seletividade propõe que os presos já diferiam dos demais antes da prisão: seriam mais violentos, teriam cometido crimes mais sérios etc. Os policiais e a justiça não podem ficar de fora: a teoria dos rótulos propõe que há comportamentos não necessariamente delinqüentes que são aprendidos na instituição e que são identificados pela polícia e pela justiça, aumentando o risco de prisão e de condenação do jovem. Estas explicações não são mutuamente exclusivas e há outras. As raras, difíceis e custosas pesquisas em que há comparações entre delinqüentes e amostras-controle da população jovem, mostram o peso da classe social, da educação, da estrutura familiar, da raça, da condição migratória, entre outras. No Brasil, estas são áreas sobre as quais se “acha” muito e se pesquisa pouco. Finalmente, a Teoria dos Encontros propõe que os comportamentos violentos e delinqüentes são aprendidos. Alguns deles, particularmente os violentos, são aprendidos em casa. Há indeterminações na aprendizagem e na execução de crimes. Alguns jovens, potencialmente abertos à criminalidade, não entram em contato com agentes socializadores negativos; outros chegam a aprender comportamentos criminosos, mas a oportunidade para executá-los não aparece durante o período em que estão disponíveis para o crime. A aplicabilidade dos resultados destas pesquisas ao Brasil é uma questão empírica, em aberto. Somos um país muito mais violento, com o dobro dos homicídios e cem milhões de habitantes a menos do que os Estados Unidos. Os jovens contribuem desproporcionalmente tanto para o rol dos mortos quanto para o rol dos assassinos. Portanto, o problema é muito mais grave no Brasil. Porém, a magnitude e a complexidade da violência no Brasil requerem mais do que meia dúzia de grupos de pesquisadores. Enquanto o estudo empírico dos problemas brasileiros não se transformar em missão precípua, nossos jovens continuarão matando e morrendo sem que saibamos por quê.

Mulheres que morrem e mulheres que matam

Mulheres que morrem e mulheres que matam

Por Gláucio Ary Dillon Soares

(baseado em artigo publicado no Jornal do Brasil, de 27 de março de 2009)

Cada país tem maneiras prediletas de olhar as coisas. Quando pegamos um avião e vamos de um país para outro mudam a geografia, a economia, às vezes o idioma. As maneiras de analisar as coisas também mudam. O Brasil tem uma tradição de ver fenômenos como os crimes e os homicídios a partir de conceitos como “o capitalismo”, a pobreza, a favelização, a desigualdade, o “desenvolvimento”, um velho explicador de tantas coisas, e outras variáveis “estruturais”. Em décadas passadas, 1950 a 1980 (minha estimativa), tudo se explicava pelo desenvolvimento ou pela sua negação, o subdesenvolvimento.

Não obstante, talvez o principal determinante da vitimização por homicídios seja o gênero: de 1980 a 2005, foram assassinados 760.885 homens e 70.907 mulheres no Brasil, o que equivale a uma mulher para cada onze homens. Essa relação não é uma constante, mas é estável, variando pouco no tempo e no espaço brasileiros. De 1980 a 1989 foi de 10,1; de 1990 a 1999 foi de 10,5 e de 2000 a 2005 foi de 11,6. Mudou pouco; não obstante se nota tendência a aumentar. Em outro trabalho, demonstramos que a razão de vitimização entre homens e mulheres aumenta quando há “explosões” de homicídios (como, recentemente, em Alagoas e na Bahia) e diminui quando há redução dos homicídios (como em São Paulo). Quando há um aumento rápido no número de homicídios, o aumento tende a vitimar mais homens e jovens; quando, através de políticas inteligentes, há uma forte redução, ela beneficia mais os que tinham taxas mais altas. Os homicídios não são todos iguais – há tipos e subtipos. No contexto brasileiro, crescimento rápido quase sempre significa tráfico, entrada de drogas, de armas de fogo, e políticas públicas inadequadas. Os homens são as maiores vitimas dessas explosões. Por sua vez, as políticas inteligentes focalizam os tipos com maior número de mortes, beneficiando desproporcionalmente os homens.

A razão entre as taxas dos gêneros não varia muito no espaço brasileiro, a despeito de amplas diferenças econômicas e sociais, mas difere muito entre os países. Em 1990, no bloco dos países com economia de mercado desenvolvida, a taxa masculina era, aproximadamente, um terço maior do que a feminina. Em regiões com taxas muito altas de homicídio, a África Sub-Saara e a América Latina, as taxas masculinas eram seis e mais de sete vezes mais altas do que as das mulheres, respectivamente. Comparativamente, no Brasil as diferenças são muito maiores do que na Europa, nos Estados Unidos, no Canadá e alguns outros países.

A influência do gênero sobre a vitimização por homicídios foi ressaltada por feministas, preocupadas com a extensa violência de homens contra mulheres. Um subproduto dessa ação foi o resgate da informação de que os homens são muito mais vítimas (e algozes também) da vitimização letal do que as mulheres.

Ela não é, apenas, uma curiosidade. As mulheres participam de homicídios em três capacidades: como autoras, como vítimas e como motivo. A pesquisa sobre cada uma dessas capacidades exige dados diferentes e produz um conjunto de conclusões. No Brasil, infelizmente, os únicos dados utilizáveis são sobre vitimização. Algumas pesquisas que incluíram o gênero nos forçaram a olhar cuidadosamente para o tipo de homicídio. Os homicídios não são todos iguais e o gênero da vítima diferencia entre muitos deles. Em quase todas as pesquisas, os homicídios entre íntimos são mais freqüentes entre as mulheres. Em relação aos demais tipos, as mulheres estão sobre-representadas tanto como vítimas quanto como autoras.

Por que as mulheres matam menos do que os homens?

Em 1990, Gottfredson e Hirschi produziram uma “teoria geral do crime” que gira ao redor da falta de autocontrole. Os autores afirmam que as pessoas sem autocontrole são impulsivas, insensíveis, respondem fisicamente aos eventos, não pesam os riscos e as conseqüências, verbalizam pouco e mal e estão super-representadas entre os criminosos. Os autores acrescentam que essas características tendem a permanecer por toda a vida. É uma de várias teorias que tentam explicar porque sempre as taxas de criminalidade são mais altas entre homens do que entre mulheres. Os homens teriam menos auto-controle. É uma relação estabelecida internacionalmente, mas cujos valores variam muito entre paises. Obviamente, a teoria de Gottfredson e Hirschi explica parte das diferenças entre os gêneros nos mesmos paises, mas não explica as diferenças entre os paises de pessoas do mesmo gênero. Por sua vez, as teorias que enfatizam as diferenças econômicas e sociais entre paises não explicam as diferenças dentro de cada país, inclusive entre os gêneros. Por que os homens pobres matam e morrem mais do que as mulheres igualmente pobres, no mesmo país? Há muitas outras teorias que competem com a de Gottfredson e Hirschi.

Há mais: a despeito das diferenças entre as taxas (homens muito mais altas), elas covariam. Plotando a taxa masculina de cada ano pela feminina, de 1980 a 2005, em escalas diferentes, vemos que a relação é estreita:

Mortes de Homens por Mortes de Mulheres, Brasil, 19080 a 2005
taxas-masculinas-pelas-femininas

Essa relação pode ser visualizada no comportamento das duas taxas no tempo: quando uma baixa, a outra baixa também, embora em nível diferente:
Variações nos Homicídios de Homens e de Mulheres, Brasil, 1980 a 2005
homicidios-dolosos-por-sexo
A aplicação ou não de uma teoria à explicação das diferenças entre homens e mulheres não é uma questão de princípio nem de ideologia, mas empírica. Poucos criminólogos sérios se colocam a disjuntiva radical entre se aplica/não se aplica, averiguando a extensão da aplicabilidade e o seu contexto.
A inclusão do gênero na equação explicativa dos homicídios contribuiu para aumentar substancialmente a variância explicada. Contribuiu, também, para estabelecer uma ponte saudável entre variáveis de tipo “macro”, estruturais, e variáveis de tipo “micro”, individuais, como gênero, idade, raça, estado civil, religião e variáveis interativas também. Afinal, o homicídio é uma interação entre pessoas, que se conheciam ou não.