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PSICOPATAS NO CODITIANO E NA POLÍTICA


Recentemente, o termo psicopata entrou no jornalismo político brasileiro. Está nas novelas, na televisão, nos jornais, na política. Há pouca precisão no uso desse termo nos jornais e nas mídias sociais. Há vários anos, estudando assassinos em série, me interessei pelos psicopatas e pelos males que podem causar. Posteriormente, num curso sobre métodos de pesquisa que ofereci em Guanajuato, uma das alunas trouxe à baila a necessidade de construir pontes entre a Psicologia e a Ciência Política, usando como argumento que quando psicopatas ocupam posições de poder as consequências podem ser desastrosas. Realizei pesquisas secundárias e uma revisão da literatura empírica, escrevendo um artigo de estilo jornalístico, que pode ser útil para alguns leitores, ainda que seja aconselhável que realizem uma atualização da bibliografia por se tratar de um tema relevante.
Transcrevo, com alguma edição:
Pensamos em psicopatas como Hollywood o faz: serial killers, estupradores sádicos etc. Porém, há psicopatas menos óbvios, e há de sobra. Muitos leigos acham que a desordem “está na cara”, mas não está; que seja só “de homens”, mas não é. A mãe de uma aluna mentia, enganava e roubava com uma cara deslavada. Porém, a patologia explodiu e tentou matar o marido com uma faca. Teve que ser internada. Até então, ninguém fora da família suspeitava que ela era uma psicopata. O interesse da aluna não era acadêmico: queria saber se estava fadada a ser psicopata também. Ela relatou, também, que a mãe mentia e mentia. Parece ser um traço que acompanha os psicopatas e que é um de seus pontos vulneráveis.
Robert Hare, um especialista mundial em psicopatologias, diz que há muitos psicopatas e não é fácil detectá-los. Falam como você, se vestem como você, parecem com você. Aliás, você pode ser psicopata e não saber. Poucos psicopatas sabem que são psicopatas. Muitos são encantadores, divertidos; leva muito tempo até identificar essa perigosa desordem de personalidade.
Paul Babiak é um psicólogo, consultor de empresas preocupadas com o prejuízo causado por executivos e empregados psicopatas. Psicopatas podem subir nas empresas, até os cargos mais altos, mas é difícil vê-los como são: insinceros, arrogantes, muito manipuladores, insensíveis aos demais; se lixam com os pensamentos, emoções e dores alheias. Seara-Cardoso e outros pesquisadores localizaram as regiões associadas com a falta de empatia na presença da dor de outros, a insula anterior, o “gyrus” frontal anterior e nas áreas anteriores e médias do córtex cingulado. Fazem alianças, mas apenas na medida em que os beneficiem. São logo descartadas. Acusam os demais por quaisquer problemas e seus próprios fracassos. Os demais são objetos. Psicopatas podem causar muita dor. Muitos desviam dinheiro, dão desfalques e fraudes, mas poucos são detectados e presos antes de prejudicar muita gente. O escândalo da Enron é emblemático. Uma empresa com um ativo de mais de 60 bilhões de dólares foi à falência em decorrência das manipulações de um psicopata na sua direção. Prejudicou muita gente.
Eu acredito, sem poder provar, que o capitalismo selvagem tornou a detecção dos psicopatas mais difícil. Alguns dos comportamentos “típicos” foram incorporados pelo capitalismo do espírito (não se trata do espírito do capitalismo), pelo consumismo. Num modelo que soma zero, se os valores materiais crescem, os humanos, religiosos e éticos decrescem. A ampla aceitação da “Lei de Gerson” tornou mais difícil distinguir psicopatas de não-psicopatas. Vários comportamentos passaram a ser iguais. O consumo é um vício que passou a ser a sua própria justificativa. Os símbolos políticos ruíram, alguns por obra de psicopatas, outros não. Os deputados do mensalão são psicopatas ou simples corruptos? O juiz Nicolau e Luiz Estevão o que são? Os milhares de funcionários públicos que recebem e não trabalham? E os que perseguiram Eduardo Jorge?
Quando a ética desaparece e a sociopatia deixa de ser uma exceção individual para ser um traço social e cultural, o que define um psicopata? Os psicopatas “sub-clínicos” quase não se distinguem da maioria da população.
O conhecimento está muito concentrado nos psicopatas violentos. Um estudo de 125 assassinos canadenses encontrou uma correlação entre escores numa escala de psicopatia (PCL-R) e o tipo de homicídio: 93% eram instrumentais, práticos, frios. Hare estima que, no Canadá, pouco mais de 1% da população é psicopata. Há estimativas piores. Se essa percentagem for válida no Brasil, temos perto de dois milhões de psicopatas! Poucos são violentos, mas todos são manipuladores, insensíveis, egoístas extremos. Hare os denominou “sub-clínicos”. Vê-los e identificá-los antes que eles nos vejam é importante, sobretudo para os policiais: nos Estados Unidos, 1% a 3% da população, 20% a 25% dos presos e quase 50% dos assassinos de policiais são psicopatas.
Como se “fabrica” um psicopata? Há uma discordância antiga entre genética e fatores sociais, nature vs nurture. Todos ganhariam trabalhando juntos, mas poucos o fazem. A genética tem um papel. Em Copenhagen os pais biológicos de crianças psicopatas adotadas tinham uma probabilidade 4 a 5 vezes mais alta de serem psicopatas. Muitos estudos sobre gêmeos, bi e monozigóticos, e sobre adotados mostram a importância dos fatores genéticos, mas há exceções. As explicações sociais extrapolam de estudos que mostram que famílias disfuncionais, violentas, inconsistentes e de um só adulto produzem muito mais delinquentes e criminosos do que as famílias integradas. Porém, muitos desses estudos não sublinham os efeitos da família, mas da falta dela, ao mostrar que parte significativa da delinquência e do crime são aprendidos na rua.
Quaisquer que sejam as causas, muito passa pelo cérebro, que é diferente: Diana Fishbein encontrou diferenças claras entre psicopatas e não psicopatas em situação de risco usando PET scans. Adrian Raine comparou 22 assassinos com 22 controles, demonstrando diferenças na absorção de glucose no córtex pré-frontal. Dominique LaPierre também encontrou problemas nessa área. O hipocampo, uma área do cérebro, parece regular a agressividade e a aprendizagem sobre quais as situações que devem provocar medo. Raine, em outro estudo, aplicou MRI e uma bateria de testes a 91 homens. O grupo foi subdividido em dois, os que haviam cometidos crimes e foram presos e os que admitiram ter cometido crimes, mas não foram presos, além de um grupo controle de pessoas normais. Verificaram que o corpus callosum, localizado no hipocampo, era, na média, 23% mais largo e 7% mais comprido. O tamanho do corpus callosum se correlacionou com menos remorso, menos emoções e menos conexões sociais. Noventa e quatro porcento dos psicopatas que foram presos tinham o lado direito do hipocampo maior do que o esquerdo, ao passo que entre os demais essa percentagem era inferior a 50%. O volume do corpus callosum também se associa com deficiências na área afetiva e interpessoal entre outras características.
Psicopatas são atraídos pelo poder, não somente no sentido “macro”, mas no sentido micro também. Buscam chefias, diretorias, participação em conselhos, representante disso ou daquilo. Porém, são projetos de poder e não de realização de um programa nem de serviço a uma comunidade. Há psicopatas e narcisistas em posições que vão desde a presidência de países, governadores, presidentes de empresas, lideres de torcidas, presidentes de sindicatos, até síndicos e líderes de gangue. O efeito cresce com o poder em suas mãos. Fritz Redlich é um médico que estuda as catástrofes provocadas pelos psicopatas que ocuparam o poder mais alto em diferentes países (como Hitler, Stalin, Slobodan Milosevic, Saddam Hussein, Adi Amin Dada). Até em níveis modestos, os psicopatas usam o poder para punir e perseguir muitas pessoas de maneira cruel porque não sentem pena nem remorso.

Encontramos psicopatas em todos os lugares. Você morar ao lado de um, morar com um, ou até ver um no espelho.

Eleições criminais

Recebi do Jorge Zaverucha

folha de sp 5 set 2010

JANIO DE FREITAS

Eleições criminais


Não há motivo para supor que das investigações resultarão consequências exigidas pelas leis


OS FATOS e os não-fatos já mencionados, em torno de dados sigilosos de pessoas ligadas a José Serra, não exigem imparcialidade virtuosa para a percepção de que, até agora, tanto poderiam proceder de um lado como de outro na disputa pela Presidência.
Assim como a petistas seria possível ocorrer a violação e o uso de sigilos para comprometer Serra, aliados de Serra poderiam pensar na montagem de um ardil para incriminar a candidatura de Dilma Rousseff. E, por ora, não se tem indício, com alguma confiabilidade, contra um lado ou outro. O que há, nesse sentido, são preferências infiltradas no noticiário e dando-lhe o tom, ainda que parte delas seja mais por precipitação do que por motivos eleitorais.
A última contribuição desse estranho personagem Antonio Carlos Atella Ferreira, que tanto perde na memória atos inesquecíveis como os recobra com rápida e fácil dubiedade, é ilustrativa do momento indefinido. “Vou fazer a vida com essa historinha”, lema que expôs logo ao ser identificado como parte do embrulho, é uma proclamação de caráter e intenções, para não dizer de objetivo de vida. A curiosidade se oferece: ainda não fez a vida?
A filiação de Atella ao PT traz para o caso mais uma peça amorfa, sujeita a questionamento: a Justiça Eleitoral. Como é possível que só seis anos depois da filiação o Tribunal Regional Eleitoral-SP a tenha “excluído” por incorreção no registro?
No intervalo 2003-2009, houve eleições para prefeito, governo do Estado, presidente da República e ainda para vereadores, deputados estaduais, deputados federais e senadores. Em São Paulo, a maior concentração da Justiça Eleitoral no país não sabia quais filiações partidárias eram corretas ou não? Logo, não seria estranho haver irregulares entre os candidatos e até entre os eleitos.
E quanto a Atella Ferreira, como e por que veio a saber da incorreç ão, afinal? Descoberta havida em momento tão propício para engrossar o caso, dois meses depois da quebra do sigilo de Verônica Serra em que é coautor, com o próprio nome a indicá-lo na fraude. A Justiça Eleitoral deve explicações.
Desde 1982, quando o SNI, o candidato Moreira Franco, integrantes do departamento de jornalismo da Globo e a empresa de informática Proconsult se uniram para fraudar a eleição no Estado do Rio, as eleições brasileiras são terreno de bandidismo eleitoral, do mais ordinário ao mais grave. Todos os episódios provocaram inquéritos de polícias estaduais e da Federal, do Ministério Público, da Justiça Eleitoral e da Justiça Criminal. Nenhum, jamais, levou a alguma das consequências determinadas pelas leis.
Estamos diante de mais um caso. Cercado de suspeições e hipóteses viáveis, em diferentes sentidos. Com toda a certeza, recheado de crimes graves, inclusive contra preceito da Constituição. M as não há motivo para supor que das várias investigações resultarão as consequências exigidas pelas leis. Eleições, aqui, misturam-se muito com outros propósitos e atividades.