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Mudanças frequentes e suicídio de adolescentes

Há uma escala de estresse na vida que inclui muitas mudanças, inclusive as consideradas boas, como casar com alguém que se ama e nos ama. Mas a tendência é clara: quanto mais mudança na nossa vida, tanto mais estresse e, secundariamente, os problemas associados com o estresse. Embora, na maioria dos países estudados, a taxa de suicídios tenda a subir com a idade, sobretudo com as idades avançadas, em vários ela sobe na adolescência e na maturidade jovem. Entre esses, em alguns ela desce depois, na maturidade, em outros não. O que explicaria esse crescimento, nos lugares em que ele acontece? Talvez comecemos a responder essa difícil pergunta, cuja resposta necessariamenete inclui muitos fatores, comparando quem não se suicida com quem se suicida (ou tentam seriamente). Uma pesquisa desse tipo acaba de ser feita na Dinamarca. O que descobriram? Que quanto mais a família se mudava de um lugar para outro, maior o risco de suicídio. Adolescentes entre 11 e 17 anos que mudaram dez ou mais vezes tinham um risco de tentar o suicídio quatro vez mais alto do que os que se mudaram que não se mudaram; os que se mudaram menos, entre de três a cinco vezes ficavam no meio: o dobro dos que nunca se mudaram e a metade dos que se mudaram dez vezes ou mais. Por conveniência de pesquisa, somente os que se mudaram de uma residência para outra na mesma rua não foram computados como mudanças. O pesquisador principal, Dr. Ping Qin, do Centre for
Register-Based Research
na Aarhus University, está consciente de que a relação não é causal nem direta. As mudanças que trazem outras mudanças, como de escolas e grupos de amigos, são mais drástica. Eu hipotetizo que mudar entre lugares conhecidos é menos estressante do que para lugares desconhecidos. Há muitas endogenias possíveis. As famílias que se movem mais podem ser menos estáveis como famílias, também podem enfrentar mais problemas financeiros, variáveis que afetam diretamente os adolescentes. Esse estudo confirma outros que revelam que as crianças e adolescentes que mudam muito de residência têm mais alto risco de doenças mentais. Há outras variáveis que também são afetadas: o rendimento na escola, o risco de abandono da escola, assim como a sexualidade prematura.

Fonte: The Archives of General Psychiatry

Fatores de risco na delinquência juvenil

Inúmeras pesquisas, em vários países, revelaram uma associação entre o consumo de drogas (incluindo as bebidas alcoólicas) , e delinqüência e criminalidade juvenis. Marvin Dawkins foi mais adiante, demonstrando que tanto “drogas” quanto “delinqüência e criminalidade juvenis” são categorias amplas, que incluem muitas coisas diferentes: drogas incluem álcool, drogas leves (como a maconha) e pesadas (como a heroína); delinqüência e criminalidade incluem desde pixação e distúrbio da paz e da ordem até o homicídio. O poder de explicação do consumo de drogas variava de pesquisa para pesquisa: muito, numas; pouco, noutras. Outros pesquisadores contribuíram para colocar a delinqüência e criminalidade num contexto mais complexo: Simonds e Kashani descobriram que o número de drogas diferentes consumidas explicava melhor os crimes contra a pessoa do que o tipo de droga. Yu e Williford elaboraram uma teoria de comportamentos em cadeia: quanto mais cedo o/a menor consome drogas socialmente mais aceitas – incluindo álcool e cigarros – tanto mais cedo consumirá drogas ilegais (maconha e cocaína) que, por sua vez, fazem com que um número maior deles cometa crimes. Esta cadeia pode ser interpretada, bioquimicamente, ou dentro de um quadro social, com ênfase na falta de controle familiar e institucional. Sem a pesquisa, a teoria dos comportamentos em cadeia seria uma entre muitas, sem validade empírica. Foi neste contexto teórico que Dawkins realizou a sua pesquisa crucial que, com apenas 312 jovens delinqüentes do sexo masculino em reformatórios, é hoje uma das mais importantes. O consumo de álcool está correlacionado com todos os comportamentos delinqüentes, mas os consumidores de maconha e de heroína estão concentrados em um número menor de ilícitos. A maconha, por exemplo, está associada ao comportamento delinqüente de gangues como a violência entre gangues, pequenos furtos de lojas, conflitos com a polícia etc. Já o consumo de heroína se relaciona com a violência e a falta de controle, expressos na seriedade da lesão provocada na vítima, na agressão a professores e supervisores, no tipo de arma usado nos crimes. Umas drogas se associam mais com alguns tipos de crime e violência do que outras. São respostas culturais. Dawkins também buscou saber qual o peso relativo das drogas em comparação com variáveis de importância demonstrada – no contexto americano – como ter sido preso e/ou condenado; ter cumprido pena e a raça do adolescente. A ficha policial e judicial do delinqüente pesa mais do que o consumo de drogas na explicação de doze comportamentos delinqüentes; o consumo de drogas pesava mais em seis comportamentos (entre os quais: conflito com a polícia; guerra de gangues; furto de partes de automóveis) e a raça em apenas dois: problemas com os pais e conflito físico com o pai, sublinhando a difícil relação entre filhos e o pai nas famílias negras americanas. O peso da “ficha” – ou história policial e judicial – passa por várias explicações. Uma hipotetiza a socialização negativa, que nos diz que as instituições de recuperação de juvenis seriam “escolas do crime”, argumento preferido pela esquerda, nos Estados Unidos como no Brasil. Supõe que as instituições ou não cumprem a sua missão de recuperação ou a cumprem mal. Se cumprissem, os que passassem por elas não voltariam a delinqüir ou, pelo menos, teriam taxas de novas delinqüências iguais à da população. A hipótese da seletividade propõe que os presos já diferiam dos demais antes da prisão: seriam mais violentos, teriam cometido crimes mais sérios etc. Os policiais e a justiça não podem ficar de fora: a teoria dos rótulos propõe que há comportamentos não necessariamente delinqüentes que são aprendidos na instituição e que são identificados pela polícia e pela justiça, aumentando o risco de prisão e de condenação do jovem. Estas explicações não são mutuamente exclusivas e há outras. As raras, difíceis e custosas pesquisas em que há comparações entre delinqüentes e amostras-controle da população jovem, mostram o peso da classe social, da educação, da estrutura familiar, da raça, da condição migratória, entre outras. No Brasil, estas são áreas sobre as quais se “acha” muito e se pesquisa pouco. Finalmente, a Teoria dos Encontros propõe que os comportamentos violentos e delinqüentes são aprendidos. Alguns deles, particularmente os violentos, são aprendidos em casa. Há indeterminações na aprendizagem e na execução de crimes. Alguns jovens, potencialmente abertos à criminalidade, não entram em contato com agentes socializadores negativos; outros chegam a aprender comportamentos criminosos, mas a oportunidade para executá-los não aparece durante o período em que estão disponíveis para o crime. A aplicabilidade dos resultados destas pesquisas ao Brasil é uma questão empírica, em aberto. Somos um país muito mais violento, com o dobro dos homicídios e cem milhões de habitantes a menos do que os Estados Unidos. Os jovens contribuem desproporcionalmente tanto para o rol dos mortos quanto para o rol dos assassinos. Portanto, o problema é muito mais grave no Brasil. Porém, a magnitude e a complexidade da violência no Brasil requerem mais do que meia dúzia de grupos de pesquisadores. Enquanto o estudo empírico dos problemas brasileiros não se transformar em missão precípua, nossos jovens continuarão matando e morrendo sem que saibamos por quê.