Arquivo da categoria: governos incompetentes

O que está acontecendo com o crime em São Paulo?

Há duas semanas, a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo tornou públicos os dados sobre a criminalidade no último trimestre. É um ato corriqueiro em paises com transparência e tem sido um comportamento contínuo no Estado de São Paulo há muitos anos. Mas, para vergonha nossa, ainda há estados no país que não divulgam os dados, há os que os maquilam e adulteram, ou os publicam com muito atraso.

Os dados divulgados talvez não causassem reação não fosse São Paulo o único estado brasileiro a exibir bons resultados há muito tempo: os homicídios vêm baixando há 29 trimestres e São Paulo é, hoje, uma referência internacional no controle da violência, juntamente com Nova Iorque, Bogotá, Medellín e alguns outros lugares. Ocupa, no Brasil, uma posição invejável. Há debates e discordância sobre o as causas dessa redução, mas não a respeito da sua existência.

O estado foi administrado pelo PSDB desde Mario Covas o que introduz uma dimensão político-partidária. Evidentemente, políticos e simpatizantes afiliados a outros partidos se sentem incômodos com o contraste entre o êxito paulista e o fracasso em tantos estados com governadores de seus partidos.

Os resultados recém divulgados não foram tão bons quanto os anteriores. Os criminólogos olham para isso com tranqüilidade; porém alguns políticos, inclusive jornalistas comprometidos politicamente, sem familiaridade com os dados criminais, expressaram sua alegria.

O que houve? Os homicídios cresceram 0,7% no Estado, porém na capital e na Grande São Paulo caíram 6%, uma queda considerável. Mesmo computando o pequeno aumento, a taxa paulista é, de longe, a mais baixa do país. Se os dados seguintes indicarem a mesma tendência à estagnação, muda a forma do fenômeno, que já é conhecida. Chegaram a um plateau.

O que é isso? Algo que acontece com quase todas as políticas públicas bem sucedidas: chegaram ao limite, até onde poderiam chegar. Aconteceu com muitas legislações e com as políticas públicas que se originaram nelas. A “antiga” Lei do Trânsito reduziu as mortes durante quase duas décadas, mas passou a provocar reduções cada vez menores. Alguns chamam isso de efeito-chão (não dá para baixar mais) que, visto positivamente, é um efeito-teto. Os efeitos desse tipo não indicam que chegamos ao limite do possível; indicam que chegamos ao limite dessas políticas. A “nova” Lei do Trânsito provocou uma redução substancial de mais de quatro mil mortes (vidas salvas) só no seu primeiro ano. Infelizmente, a implementação das mesmas medidas ficou cada vez mais desleixadas e as mortes no trânsito voltaram a aumentar.

É importante saber que, quando há um grande crescimento ou uma grande redução, a composição dos homicídios se altera. Vítimas e assassinos não são os mesmos quando as taxas são altas e quando são baixas. Os homicídios não são todos iguais; há tipos muito diferentes – difere a vítima, difere o autor, difere a relação entre eles, difere a arma, difere o local da ocorrência e muito mais. No Brasil das últimas décadas, o crescimento dos homicídios tem uma vinculação íntima com o tráfico de drogas e de armas e com o crime organizado (sem colocar o grau de “organização” dos traficantes num nível empresarial). Quando há explosões de homicídios, as taxas de crescimento das mortes masculinas é substancialmente mais alta do que a das femininas. Quando houve redução rápida, ela foi maior entre os homens. As políticas públicas aconselhadas para paises com altas taxas de homicídio são claramente diferentes das aconselhadas para países com baixas taxas.

Quando o êxito das políticas anteriores tem rendimentos decrescentes significa que há necessidade de novas políticas, assim como de aperfeiçoamento das anteriores. Reduzidos os homicídios relacionados com o tráfico, cresce a significação relative dos homicídios entre íntimos. Porém, a prevenção de homicídios entre íntimos difere muito da prevenção de homicídios associados ao tráfico etc.

Crimes diferentes não têm a mesma fidedignidade, nem o mesmo peso, daí a dificuldade em construir índices de criminalidade – nos mais simples, que simplesmente somam os crimes, o furto de um celular pesa tanto quanto um homicídio, um absurdo. As pesquisas de vitimização mostram que a sub-enumeração de alguns crimes é de tal magnitude que desfigura os dados. Um “crescimento” pode não significar um crescimento do crime, mas da confiança nas instituições. Há perigosos viéses seletivos: escolher os que mais cresceram para desacreditar a política ou os que mais caíram para mostrar seus méritos. Um dos artigos publicados mostra um crescimento de 36% nos latrocínios, sem informar que os latrocínios representam uma percentagem pequena do total de mortes violentas intencionais. Naquele trimestre houve 94 latrocínios, 1001 homicídios culposos no trânsito, e 1207 vitimas de homicídios intencionais. A redução nos homicídios culposos no trânsito foi maior que a totalidade dos latrocínios no trimestre…

Outro dado importante tem a ver com a distribuição geográfica dos crimes com estatísticas confiáveis. Há muita variação entre as taxas dos municípios e das regiões paulistas, sugerindo fenômenos mais localizados que requerem atenção concentrada: algo diferente está acontecendo nessas áreas.

Precisamos melhorar a qualidade dos dados e reduzir a sub-enumeração dos  crimes. Enquanto isso não acontece, temos que trabalhar com os mais confiáveis: os que deixam cadáveres, assim como furtos e roubos de veículos, dada a obrigatoriedade do registro para obter o seguro. E o leitor deve se informar para poder ler criticamente o que publica.

Gláucio Ary Dillon Soares

Publicado no Correio Braziliense

Carta da mãe de uma vítima do desastre do avião da TAM em Congonhas

Recebi cópia de carta da mãe de uma vítima do desastre do avião da TAM em Congonhas. Não tenho como averiguar nem verificar nada. Publico porque se encaixa e ilustra a dor que acompanhará familiares e amigos, assim como a indignação com personagens envolvidos nessa série de insensibilidades, incluíndo políticos e seus protegidos, do governo e da oposição.



Aos
governantes e à família brasileira,


Perdi o meu único filho.
Ninguém, a não ser outra mãe que tenha passado por semelhante tragédia, pode ter experimentado dor maior.
Mesmo sem ter sido dada qualquer publicidade à missa que ontem oferecemos à alma de meu filho, Luís Fernando Soares Zacchini, mais de cem pessoas compareceram. Em todos os olhos havia lágrimas. Lágrimas sinceras de dor, de saudade,de empatia. Meus olhos refletiam todos os prantos derramados por ele, por mim,por seu filhinho, por sua esposa, por todos parentes e amigos. Por todos os sacrificados na catástrofe do Aeroporto de Congonhas.
Há muito eu sabia que desastres aéreos iriam acontecer. Sabia que os vôos neste país não oferecem segurança no céu e na terra. Que no Brasil a voracidade de vender bilhetes aéreos superou o respeito à vida humana. A culpa é lançada sobre um número insuficiente de mal remunerados operadores aéreos ou sobre as condições das turbinas dos aviões.
Um Governo alheio a vaias é responsável pelo desmonte de uma das mais respeitáveis e confiáveis empresas aéreas do mundo, a VARIG, em benefício da TAM, desde então, a principal provedora de bilhetes pagos pelo Governo. Que a opinião pública é desviada para supostos erros de bodes expiatórios, permitindo aos ambíguos incompetentes que nos governam continuarem sua ação impune. Que nossos aeroportos não têm condições de atender à crescente demanda de vôos cujo preço é o mais caro do mundo. Quando os usuários aguardam uma explicação, à falta de respeito ao cidadão juntam-se o escárnio e a cruel vulgaridade de uma ministra recomendando aos viajantes prejudicados que relaxem e gozem. Assuntos de alcova não condizentes com a reta postura moral e respeito exigidos no exercício de cargos públicos. Assessores do presidente deste país eximem-se da responsabilidade e do compromisso com a segurança de nosso povo exibindo gestos pornográficos. Gestos mais apropriados a bordéis do que a gabinetes presidenciais. Ao invés de se arrependerem de uma conduta chula, incompatível com a dignidade de um povo doce e amável como o brasileiro, ainda alardeiam indignação, único sentimento ao alcance dos indignos.
Aqueles que deveriam comandar a responsabilidade pelo tráfego aéreo no Brasil nada fazem exceto conchavos. Aceitam as vantagens de um cargo sem sequer diferenciarem caixa preta de sucata. Tanto que oneraram e humilharam o país ao levar o material errado para ser examinado em Washington. Essas são as mesmas autoridades agraciadas com louvor e condecorações do Governo em nome do povo brasileiro, enquanto toda a nação, no auge de sofrimento, chorava a perda de seus filhos.
Tudo isto eu sabia. A mim, bastava-me minha dor, bastava meu pranto, bastava o
sofrimento dos que me amam, dos que amaram meu filho. Nenhum choro ou lamento
iria aumentar ou minorar tanta tristeza. Dores iguais ou maiores que a minha,
de outras mães, dos pais, filhos e amigos dos mortos necessitam de consolo.
A solidariedade e amor ao próximo obrigam-nos a esquecer a própria dor. Não pensei, contudo, que teria de passar por mais um insulto: ouvir a falsidade de um presidente, sob a forma de ensaiadas e demagógicas palavras de conforto. Um texto certamente encomendado a um hábil redator, dirigido mais à opinião pública do que a nossos corações, ao nosso luto, às nossas vítimas. Palavras que soaram tão falsas quanto a forçada e patética tentativa que demonstrou ao simular uma lágrima. Não, francamente eu não merecia ter de me submeter a mais essa provação nem necessitava presenciar a estúpida cena: ver o chefe da nação sofismar um sofrimento que não compartilhava conosco.
Senhores governantes: há dias vejo o mundo através de lágrimas amargas mas verdadeiras. Confundem-se com as lágrimas sinceras e puras de todos os corações amigos. Há dias, da forma mais dolorosa possível, aprendi o que é o verdadeiro amor. O amor humano, o Amor Divino. O amor é inefável, o amor é um sentimento despojado de interesse, não recorre a histriônicas atitudes políticas.
Não jorra das bocas, flui do coração!
E que Deus nos abençoe!

Adi Maria Vasconcellos Soares

Porto Alegre, 21 de julho de 2007.

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Carta da mãe de uma vítima do desastre do avião da TAM em Congonhas

Recebi cópia de carta da mãe de uma vítima do desastre do avião da TAM em Congonhas. Não tenho como averiguar nem verificar nada. Publico porque se encaixa e ilustra a dor que acompanhará familiares e amigos, assim como a indignação com personagens envolvidos nessa série de insensibilidades, incluíndo políticos e seus protegidos, do governo e da oposição.



Aos
governantes e à família brasileira,


Perdi o meu único filho.
Ninguém, a não ser outra mãe que tenha passado por semelhante tragédia, pode ter experimentado dor maior.
Mesmo sem ter sido dada qualquer publicidade à missa que ontem oferecemos à alma de meu filho, Luís Fernando Soares Zacchini, mais de cem pessoas compareceram. Em todos os olhos havia lágrimas. Lágrimas sinceras de dor, de saudade,de empatia. Meus olhos refletiam todos os prantos derramados por ele, por mim,por seu filhinho, por sua esposa, por todos parentes e amigos. Por todos os sacrificados na catástrofe do Aeroporto de Congonhas.
Há muito eu sabia que desastres aéreos iriam acontecer. Sabia que os vôos neste país não oferecem segurança no céu e na terra. Que no Brasil a voracidade de vender bilhetes aéreos superou o respeito à vida humana. A culpa é lançada sobre um número insuficiente de mal remunerados operadores aéreos ou sobre as condições das turbinas dos aviões.
Um Governo alheio a vaias é responsável pelo desmonte de uma das mais respeitáveis e confiáveis empresas aéreas do mundo, a VARIG, em benefício da TAM, desde então, a principal provedora de bilhetes pagos pelo Governo. Que a opinião pública é desviada para supostos erros de bodes expiatórios, permitindo aos ambíguos incompetentes que nos governam continuarem sua ação impune. Que nossos aeroportos não têm condições de atender à crescente demanda de vôos cujo preço é o mais caro do mundo. Quando os usuários aguardam uma explicação, à falta de respeito ao cidadão juntam-se o escárnio e a cruel vulgaridade de uma ministra recomendando aos viajantes prejudicados que relaxem e gozem. Assuntos de alcova não condizentes com a reta postura moral e respeito exigidos no exercício de cargos públicos. Assessores do presidente deste país eximem-se da responsabilidade e do compromisso com a segurança de nosso povo exibindo gestos pornográficos. Gestos mais apropriados a bordéis do que a gabinetes presidenciais. Ao invés de se arrependerem de uma conduta chula, incompatível com a dignidade de um povo doce e amável como o brasileiro, ainda alardeiam indignação, único sentimento ao alcance dos indignos.
Aqueles que deveriam comandar a responsabilidade pelo tráfego aéreo no Brasil nada fazem exceto conchavos. Aceitam as vantagens de um cargo sem sequer diferenciarem caixa preta de sucata. Tanto que oneraram e humilharam o país ao levar o material errado para ser examinado em Washington. Essas são as mesmas autoridades agraciadas com louvor e condecorações do Governo em nome do povo brasileiro, enquanto toda a nação, no auge de sofrimento, chorava a perda de seus filhos.
Tudo isto eu sabia. A mim, bastava-me minha dor, bastava meu pranto, bastava o
sofrimento dos que me amam, dos que amaram meu filho. Nenhum choro ou lamento
iria aumentar ou minorar tanta tristeza. Dores iguais ou maiores que a minha,
de outras mães, dos pais, filhos e amigos dos mortos necessitam de consolo.
A solidariedade e amor ao próximo obrigam-nos a esquecer a própria dor. Não pensei, contudo, que teria de passar por mais um insulto: ouvir a falsidade de um presidente, sob a forma de ensaiadas e demagógicas palavras de conforto. Um texto certamente encomendado a um hábil redator, dirigido mais à opinião pública do que a nossos corações, ao nosso luto, às nossas vítimas. Palavras que soaram tão falsas quanto a forçada e patética tentativa que demonstrou ao simular uma lágrima. Não, francamente eu não merecia ter de me submeter a mais essa provação nem necessitava presenciar a estúpida cena: ver o chefe da nação sofismar um sofrimento que não compartilhava conosco.
Senhores governantes: há dias vejo o mundo através de lágrimas amargas mas verdadeiras. Confundem-se com as lágrimas sinceras e puras de todos os corações amigos. Há dias, da forma mais dolorosa possível, aprendi o que é o verdadeiro amor. O amor humano, o Amor Divino. O amor é inefável, o amor é um sentimento despojado de interesse, não recorre a histriônicas atitudes políticas.
Não jorra das bocas, flui do coração!
E que Deus nos abençoe!

Adi Maria Vasconcellos Soares

Porto Alegre, 21 de julho de 2007.

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Carta da mãe de uma vítima do desastre do avião da TAM em Congonhas

Recebi cópia de carta da mãe de uma vítima do desastre do avião da TAM em Congonhas. Não tenho como averiguar nem verificar nada. Publico porque se encaixa e ilustra a dor que acompanhará familiares e amigos, assim como a indignação com personagens envolvidos nessa série de insensibilidades, incluíndo políticos e seus protegidos, do governo e da oposição.



Aos
governantes e à família brasileira,


Perdi o meu único filho.
Ninguém, a não ser outra mãe que tenha passado por semelhante tragédia, pode ter experimentado dor maior.
Mesmo sem ter sido dada qualquer publicidade à missa que ontem oferecemos à alma de meu filho, Luís Fernando Soares Zacchini, mais de cem pessoas compareceram. Em todos os olhos havia lágrimas. Lágrimas sinceras de dor, de saudade,de empatia. Meus olhos refletiam todos os prantos derramados por ele, por mim,por seu filhinho, por sua esposa, por todos parentes e amigos. Por todos os sacrificados na catástrofe do Aeroporto de Congonhas.
Há muito eu sabia que desastres aéreos iriam acontecer. Sabia que os vôos neste país não oferecem segurança no céu e na terra. Que no Brasil a voracidade de vender bilhetes aéreos superou o respeito à vida humana. A culpa é lançada sobre um número insuficiente de mal remunerados operadores aéreos ou sobre as condições das turbinas dos aviões.
Um Governo alheio a vaias é responsável pelo desmonte de uma das mais respeitáveis e confiáveis empresas aéreas do mundo, a VARIG, em benefício da TAM, desde então, a principal provedora de bilhetes pagos pelo Governo. Que a opinião pública é desviada para supostos erros de bodes expiatórios, permitindo aos ambíguos incompetentes que nos governam continuarem sua ação impune. Que nossos aeroportos não têm condições de atender à crescente demanda de vôos cujo preço é o mais caro do mundo. Quando os usuários aguardam uma explicação, à falta de respeito ao cidadão juntam-se o escárnio e a cruel vulgaridade de uma ministra recomendando aos viajantes prejudicados que relaxem e gozem. Assuntos de alcova não condizentes com a reta postura moral e respeito exigidos no exercício de cargos públicos. Assessores do presidente deste país eximem-se da responsabilidade e do compromisso com a segurança de nosso povo exibindo gestos pornográficos. Gestos mais apropriados a bordéis do que a gabinetes presidenciais. Ao invés de se arrependerem de uma conduta chula, incompatível com a dignidade de um povo doce e amável como o brasileiro, ainda alardeiam indignação, único sentimento ao alcance dos indignos.
Aqueles que deveriam comandar a responsabilidade pelo tráfego aéreo no Brasil nada fazem exceto conchavos. Aceitam as vantagens de um cargo sem sequer diferenciarem caixa preta de sucata. Tanto que oneraram e humilharam o país ao levar o material errado para ser examinado em Washington. Essas são as mesmas autoridades agraciadas com louvor e condecorações do Governo em nome do povo brasileiro, enquanto toda a nação, no auge de sofrimento, chorava a perda de seus filhos.
Tudo isto eu sabia. A mim, bastava-me minha dor, bastava meu pranto, bastava o
sofrimento dos que me amam, dos que amaram meu filho. Nenhum choro ou lamento
iria aumentar ou minorar tanta tristeza. Dores iguais ou maiores que a minha,
de outras mães, dos pais, filhos e amigos dos mortos necessitam de consolo.
A solidariedade e amor ao próximo obrigam-nos a esquecer a própria dor. Não pensei, contudo, que teria de passar por mais um insulto: ouvir a falsidade de um presidente, sob a forma de ensaiadas e demagógicas palavras de conforto. Um texto certamente encomendado a um hábil redator, dirigido mais à opinião pública do que a nossos corações, ao nosso luto, às nossas vítimas. Palavras que soaram tão falsas quanto a forçada e patética tentativa que demonstrou ao simular uma lágrima. Não, francamente eu não merecia ter de me submeter a mais essa provação nem necessitava presenciar a estúpida cena: ver o chefe da nação sofismar um sofrimento que não compartilhava conosco.
Senhores governantes: há dias vejo o mundo através de lágrimas amargas mas verdadeiras. Confundem-se com as lágrimas sinceras e puras de todos os corações amigos. Há dias, da forma mais dolorosa possível, aprendi o que é o verdadeiro amor. O amor humano, o Amor Divino. O amor é inefável, o amor é um sentimento despojado de interesse, não recorre a histriônicas atitudes políticas.
Não jorra das bocas, flui do coração!
E que Deus nos abençoe!

Adi Maria Vasconcellos Soares

Porto Alegre, 21 de julho de 2007.

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Morrer de burocracia

Morrer de burocracia

  • Morrer de burocracia

     

     

    Gabrielle é uma menina de cinco anos, alegre e vivaz, com olhinhos negros que parecem falar. Teve uma doença raríssima e foi parar num hospital pediátrico que é uma referência no sul do país. A equipe médica, dedicada, bem que tentou, mas não atinou com o diagnóstico correto; seus testes foram enviados a São Paulo, onde um dos médicos, por casualidade, havia visto ou sabido de um caso. Em 24 horas o diagnóstico chegou ao hospital, mas era tarde. Devido à trombose e necrose das artérias distais, ela perdeu as duas pernas e um braço. Gabrielle gostava de dançar e continua alegre e brinca de dançar com os seus tocos. A alegria de Gabrielle provoca lágrimas na equipe médica. Gabrielle espera inocentemente as próteses que chegarão em breve. A dureza da realidade virá depois, talvez na adolescência, talvez antes.

    Os médicos precisam saber idiomas, sobretudo Inglês, e ter acesso local, fácil, a bases de dados atualizadas que são de extrema utilidade. Um sistema computarizado de informações indexadas e cruzadas, nacional e internacional, salvaria muitas vidas e facilitaria, particularmente, o diagnóstico de pacientes com doenças com as que ninguém teve experiência clínica. Uma das médicas o chamou de SOS diagnóstico. Gabrielle foi tratada em um hospital pediátrico especializado por uma equipe dedicada que sofreu e sofre por não ter diagnosticado a doença 24 ou 48 horas antes. Não tinham como fazê-lo. O mesmo hospital que, repito, é referência, não tem um aparelho de Tomografia Computarizada (TC). Os pacientes tem que sair para fazer o exame em outro lugar – independentemente do estado físico, alguns em estado grave, outros não,  chova ou faça sol, frio ou calor. Além disso, há necessidade de autorizações – a burocracia protela e os exames não são feitos com a rapidez necessária. Alguns morreram e outros morrerão por causa da lentidão no processamento das autorizações. Lembrei as palavras de um ativista americano, aidético, que declarou que não queria morrer de "red tape", de burocracia no processamento dos recursos para pesquisas. Morreu. As vítimas preferenciais da AIDS naquela época, gays e receptores de transfusão de sangue contaminado, morreram devido à falta de recursos para tratar essa doença, parcialmente creditável ao preconceito de Ronald Reagan e sua equipe. Não sabemos quantas vidas humanas teriam sido salvas se o combate sério à AIDS, através da pesquisa e da prevenção, não tivesse esperado quase uma década.

    O que custa um aparelho de TC de corpo inteiro? De acordo com o Departamento de Defesa dos Estados Unidos custa perto de 500 mil dólares e 1.500 usos ao ano justificariam a sua aquisição. São quatro usos ao dia. Na cultura do dinheiro que, infelizmente, é a nossa também, o custo em vida e sofrimento não foi sequer estimado e não entrou na equação. Em outros lugares do país, a situação é muito pior, catastrófica: não há leitos, falta tudo, até soro fisiológico.

    Nem só de burocracia se morre no Brasil: se morre de política também. Francine era uma menina inteligente, pobre, de olhos verdes que sofreu queimaduras por álcool em quase todo o corpo e morreu aos 14 anos. Estava tão desfigurada que vários achavam que fora a melhor solução, ainda que triste. O álcool líquido, que é uma das causas principais de queimaduras em crianças (o gel reduz dramaticamente o número de acidentes), era proibido naquele estado, mas as produtoras pressionaram e os deputados estaduais não resistiram. Não houve debate político porque não há lobby que defenda os interesses das crianças que serão mortas ou desfiguradas. Os médicos escreveram para os jornais protestando, mas os políticos não ouviram. Francine, e outras crianças, morreram queimadas – uma por dia no país.

             Mas não só de burocracia e política se morre no Brasil. Os R$ 169 milhões super-faturados na obra do TRT paulista, desvio coordenado pelo juiz Nicolau dos Santos Neto, seriam suficientes para instalar CT scans em cento e trinta hospitais; outra gangue roubou mais de 120 milhões do INSS, com os que dotaríamos mil postos de saúde carentes de materiais essenciais por um ano.

             Mas não só de burocracia, política e corrupção ostensiva morrem os brasileiros. O setor público gastou 13 bilhões de reais com passagens aéreas, água, luz, telefone, consultorias, pagamentos a terceiros, boys, cafezinho etc. Muitos não viajam de classe turista, como nós: viajam de Classe Executiva. Estado rico, povo pobre. Uma redução modesta de 20% nesses gastos nos deixaria com 2.6 bilhões para investir. Não dá para estimar quantas vidas seriam salvas com esses recursos.

             Quando passo por um cemitério, não consigo deixar de perguntar quantos morreram de burocracia? E quantos de vocês, que me estão lendo, serão vítimas do Estado e suas mazelas?

     

    Gláucio Ary Dillon Soares

     – post by soares_7

Morrer de burocracia

Morrer de burocracia

  • Morrer de burocracia

     

     

    Gabrielle é uma menina de cinco anos, alegre e vivaz, com olhinhos negros que parecem falar. Teve uma doença raríssima e foi parar num hospital pediátrico que é uma referência no sul do país. A equipe médica, dedicada, bem que tentou, mas não atinou com o diagnóstico correto; seus testes foram enviados a São Paulo, onde um dos médicos, por casualidade, havia visto ou sabido de um caso. Em 24 horas o diagnóstico chegou ao hospital, mas era tarde. Devido à trombose e necrose das artérias distais, ela perdeu as duas pernas e um braço. Gabrielle gostava de dançar e continua alegre e brinca de dançar com os seus tocos. A alegria de Gabrielle provoca lágrimas na equipe médica. Gabrielle espera inocentemente as próteses que chegarão em breve. A dureza da realidade virá depois, talvez na adolescência, talvez antes.

    Os médicos precisam saber idiomas, sobretudo Inglês, e ter acesso local, fácil, a bases de dados atualizadas que são de extrema utilidade. Um sistema computarizado de informações indexadas e cruzadas, nacional e internacional, salvaria muitas vidas e facilitaria, particularmente, o diagnóstico de pacientes com doenças com as que ninguém teve experiência clínica. Uma das médicas o chamou de SOS diagnóstico. Gabrielle foi tratada em um hospital pediátrico especializado por uma equipe dedicada que sofreu e sofre por não ter diagnosticado a doença 24 ou 48 horas antes. Não tinham como fazê-lo. O mesmo hospital que, repito, é referência, não tem um aparelho de Tomografia Computarizada (TC). Os pacientes tem que sair para fazer o exame em outro lugar – independentemente do estado físico, alguns em estado grave, outros não,  chova ou faça sol, frio ou calor. Além disso, há necessidade de autorizações – a burocracia protela e os exames não são feitos com a rapidez necessária. Alguns morreram e outros morrerão por causa da lentidão no processamento das autorizações. Lembrei as palavras de um ativista americano, aidético, que declarou que não queria morrer de "red tape", de burocracia no processamento dos recursos para pesquisas. Morreu. As vítimas preferenciais da AIDS naquela época, gays e receptores de transfusão de sangue contaminado, morreram devido à falta de recursos para tratar essa doença, parcialmente creditável ao preconceito de Ronald Reagan e sua equipe. Não sabemos quantas vidas humanas teriam sido salvas se o combate sério à AIDS, através da pesquisa e da prevenção, não tivesse esperado quase uma década.

    O que custa um aparelho de TC de corpo inteiro? De acordo com o Departamento de Defesa dos Estados Unidos custa perto de 500 mil dólares e 1.500 usos ao ano justificariam a sua aquisição. São quatro usos ao dia. Na cultura do dinheiro que, infelizmente, é a nossa também, o custo em vida e sofrimento não foi sequer estimado e não entrou na equação. Em outros lugares do país, a situação é muito pior, catastrófica: não há leitos, falta tudo, até soro fisiológico.

    Nem só de burocracia se morre no Brasil: se morre de política também. Francine era uma menina inteligente, pobre, de olhos verdes que sofreu queimaduras por álcool em quase todo o corpo e morreu aos 14 anos. Estava tão desfigurada que vários achavam que fora a melhor solução, ainda que triste. O álcool líquido, que é uma das causas principais de queimaduras em crianças (o gel reduz dramaticamente o número de acidentes), era proibido naquele estado, mas as produtoras pressionaram e os deputados estaduais não resistiram. Não houve debate político porque não há lobby que defenda os interesses das crianças que serão mortas ou desfiguradas. Os médicos escreveram para os jornais protestando, mas os políticos não ouviram. Francine, e outras crianças, morreram queimadas – uma por dia no país.

             Mas não só de burocracia e política se morre no Brasil. Os R$ 169 milhões super-faturados na obra do TRT paulista, desvio coordenado pelo juiz Nicolau dos Santos Neto, seriam suficientes para instalar CT scans em cento e trinta hospitais; outra gangue roubou mais de 120 milhões do INSS, com os que dotaríamos mil postos de saúde carentes de materiais essenciais por um ano.

             Mas não só de burocracia, política e corrupção ostensiva morrem os brasileiros. O setor público gastou 13 bilhões de reais com passagens aéreas, água, luz, telefone, consultorias, pagamentos a terceiros, boys, cafezinho etc. Muitos não viajam de classe turista, como nós: viajam de Classe Executiva. Estado rico, povo pobre. Uma redução modesta de 20% nesses gastos nos deixaria com 2.6 bilhões para investir. Não dá para estimar quantas vidas seriam salvas com esses recursos.

             Quando passo por um cemitério, não consigo deixar de perguntar quantos morreram de burocracia? E quantos de vocês, que me estão lendo, serão vítimas do Estado e suas mazelas?

     

    Gláucio Ary Dillon Soares

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Morrer de burocracia

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    Gabrielle é uma menina de cinco anos, alegre e vivaz, com olhinhos negros que parecem falar. Teve uma doença raríssima e foi parar num hospital pediátrico que é uma referência no sul do país. A equipe médica, dedicada, bem que tentou, mas não atinou com o diagnóstico correto; seus testes foram enviados a São Paulo, onde um dos médicos, por casualidade, havia visto ou sabido de um caso. Em 24 horas o diagnóstico chegou ao hospital, mas era tarde. Devido à trombose e necrose das artérias distais, ela perdeu as duas pernas e um braço. Gabrielle gostava de dançar e continua alegre e brinca de dançar com os seus tocos. A alegria de Gabrielle provoca lágrimas na equipe médica. Gabrielle espera inocentemente as próteses que chegarão em breve. A dureza da realidade virá depois, talvez na adolescência, talvez antes.

    Os médicos precisam saber idiomas, sobretudo Inglês, e ter acesso local, fácil, a bases de dados atualizadas que são de extrema utilidade. Um sistema computarizado de informações indexadas e cruzadas, nacional e internacional, salvaria muitas vidas e facilitaria, particularmente, o diagnóstico de pacientes com doenças com as que ninguém teve experiência clínica. Uma das médicas o chamou de SOS diagnóstico. Gabrielle foi tratada em um hospital pediátrico especializado por uma equipe dedicada que sofreu e sofre por não ter diagnosticado a doença 24 ou 48 horas antes. Não tinham como fazê-lo. O mesmo hospital que, repito, é referência, não tem um aparelho de Tomografia Computarizada (TC). Os pacientes tem que sair para fazer o exame em outro lugar – independentemente do estado físico, alguns em estado grave, outros não,  chova ou faça sol, frio ou calor. Além disso, há necessidade de autorizações – a burocracia protela e os exames não são feitos com a rapidez necessária. Alguns morreram e outros morrerão por causa da lentidão no processamento das autorizações. Lembrei as palavras de um ativista americano, aidético, que declarou que não queria morrer de "red tape", de burocracia no processamento dos recursos para pesquisas. Morreu. As vítimas preferenciais da AIDS naquela época, gays e receptores de transfusão de sangue contaminado, morreram devido à falta de recursos para tratar essa doença, parcialmente creditável ao preconceito de Ronald Reagan e sua equipe. Não sabemos quantas vidas humanas teriam sido salvas se o combate sério à AIDS, através da pesquisa e da prevenção, não tivesse esperado quase uma década.

    O que custa um aparelho de TC de corpo inteiro? De acordo com o Departamento de Defesa dos Estados Unidos custa perto de 500 mil dólares e 1.500 usos ao ano justificariam a sua aquisição. São quatro usos ao dia. Na cultura do dinheiro que, infelizmente, é a nossa também, o custo em vida e sofrimento não foi sequer estimado e não entrou na equação. Em outros lugares do país, a situação é muito pior, catastrófica: não há leitos, falta tudo, até soro fisiológico.

    Nem só de burocracia se morre no Brasil: se morre de política também. Francine era uma menina inteligente, pobre, de olhos verdes que sofreu queimaduras por álcool em quase todo o corpo e morreu aos 14 anos. Estava tão desfigurada que vários achavam que fora a melhor solução, ainda que triste. O álcool líquido, que é uma das causas principais de queimaduras em crianças (o gel reduz dramaticamente o número de acidentes), era proibido naquele estado, mas as produtoras pressionaram e os deputados estaduais não resistiram. Não houve debate político porque não há lobby que defenda os interesses das crianças que serão mortas ou desfiguradas. Os médicos escreveram para os jornais protestando, mas os políticos não ouviram. Francine, e outras crianças, morreram queimadas – uma por dia no país.

             Mas não só de burocracia e política se morre no Brasil. Os R$ 169 milhões super-faturados na obra do TRT paulista, desvio coordenado pelo juiz Nicolau dos Santos Neto, seriam suficientes para instalar CT scans em cento e trinta hospitais; outra gangue roubou mais de 120 milhões do INSS, com os que dotaríamos mil postos de saúde carentes de materiais essenciais por um ano.

             Mas não só de burocracia, política e corrupção ostensiva morrem os brasileiros. O setor público gastou 13 bilhões de reais com passagens aéreas, água, luz, telefone, consultorias, pagamentos a terceiros, boys, cafezinho etc. Muitos não viajam de classe turista, como nós: viajam de Classe Executiva. Estado rico, povo pobre. Uma redução modesta de 20% nesses gastos nos deixaria com 2.6 bilhões para investir. Não dá para estimar quantas vidas seriam salvas com esses recursos.

             Quando passo por um cemitério, não consigo deixar de perguntar quantos morreram de burocracia? E quantos de vocês, que me estão lendo, serão vítimas do Estado e suas mazelas?

     

    Gláucio Ary Dillon Soares

     – post by soares_7